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GASTAR BEM O POUCO QUE AÍ VEM

(Não se pode anunciar dinheiro para projectos numa região, sem que, antes, se defina qual o plano de desenvolvimento que está previsto para essa região. A mesma regra se aplica ao país)

Se há algo que me preocupa no Plano de Recuperação e Resiliência, é o seu generalismo. E o facto de estabelecer modelos de desenvolvimento que deixam grande parte do país de fora, com especial incidência no interior.

É um Plano para os grandes centros, médios centros, mas sem qualquer envolvência nos pequenos recantos urbanos e as grandes extensões rurais do país.

É um Plano que não contesta a desertificação e a aceita como facto consumado, não estabelecendo, por isso, qualquer estratégia de inversão.

Esta constatação leva-nos mais longe ao ponto de podermos dizer que este Plano é uma amálgama de actos avulsos sem estabelecer o essencial: o modelo económico e de desenvolvimento que se pretende para o país. 

Por exemplo: 

no que se refere ao interior, nomeadamente a Trás-os-Montes e Alto Douro, para além de estabelecer um gasto de cerca de 35 milhões de euros com a ligação rodoviária de Bragança a Espanha, e algumas vias para os centros empresariais de Chaves e Constantim, deixa todo o resto ao cargo de eventuais projectos a apresentar em candidatura pelas empresas.

Para todos os efeitos isto é um erro de base, um erro primário. Não se pode anunciar dinheiros para projectos numa região, sem que, antes, de defina qual o plano de desenvolvimento que está previsto para essa região, as áreas em que se vão apostar, os produtos em que se deve investir, etc.

E, do mesmo modo, não se podem anunciar biliões para gastar com infra-estruturas e equipamentos, determinar montantes que serão entregues ao sector público e ao sector privado, sem que se discuta com objectividade o que se pretende que este país seja, económica, social e politicamente, daqui a 30 ou a 40 anos. 

É preciso saber-se aonde se quer chegar para que se encontre o caminho.

Durante muitos meses, desde que foi anunciado, esperou-se o suficiente para a classe política se debruçasse sobre este assunto. 

Houve tempo mais do que suficiente para que cada um soubesse o que queria. 

Depois veio a guerra, e apesar desta ter alterado radicalmente o quadro geoestratégico do mundo, o facto é que os princípios quer regem os países, ou seja: a forma como querem viver e o modelo que querem adoptar, não se alterou nem se alterará com o conflito. Poderá, sim, haver oscilações económicas, alterações no modo de vida, limitações ao que estávamos habituados, e sacrifícios de toda a ordem que se tenham que fazer, mas os princípios e os valores nunca se alterarão.

Portugal arrisca-se a continuar a  ficar com a uma faixa litoral super habitada, cheia de problema de concentração urbana excessiva, e deixar ao abandono a maior parte do seu território.

Porque não é capaz de definir um modelo de desenvolvimento que englobe todo o país, que potencie as qualidades do interior, que o integre no todo nacional, que o torne atractivo. Infelizmente, quando se fala em interior, fala-se só em barragens e minas. 

É o que interessa.

E nem sequer o sector agrícola é tido como pedra fundamental da sustentabilidade do país.

Esta guerra está a demonstrar que os países, nomeadamente os que podem e para isso têm condições, têm que ter autonomias totais ou parciais, relativamente a determinados parâmetros sem os quais estarão sempre dependentes de outros e, como consequência, da guerra. Porque a guerra também se faz por quem pode perante a debilidade de quem não pode.

Já aqui falei por diversas vezes, e voltarei a falar, sobre a questão da energia, sobre a qual os países têm de se debruçar e tratar de vida, isto é: serem capazes de produzir energias que não os torne mendicantes de terceiros. 

E a agricultura. 

Portugal tem de apostar em determinadas culturas, muitas delas tradicionais que foram praticamente abandonadas, e mesmo que grande parte delas não nos garanta a autonomia absoluta, ajudam a que a dependência não seja total, podendo mesmo servir de remedeio quanto baste e seja necessário.

Ter dinheiro, ou recebê-lo de que maneira for, não basta para desenvolver um país. 

É preciso saber aplicar cada cêntimo com inteligência.

Mas falar em planeamento e programação em Portugal, é conversa de surdos.

Se calhar, nem nos podemos queixar muito da política de caranguejo que sempre tivemos. 

De Francisco Gouveia Engº gouveiafrancisco@gmail.com

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